sábado, 2 de março de 2013

O TREM DAS ESTRELAS



Estavam todos suavemente acomodados. Alguns olhavam para o lado de fora como a catar recordações perdidas. Outros conversavam no balanço das horas.

Num espaço mais a frente aquele senhor muito magro, calvo, de óculos de lentes redondas, e de trajes longos, pacientemente falava a um grupinho, sobre a importância da não-agressão, mesmo quando se é agredido.

- “Principalmente nessas horas, dizia Gandhi, devemos manter a serenidade. Não é preciso aniquilar pela força com o invasor, basta não obedecê-lo para tornar inviável a dominação dos brutos”.

O que o senhor acha presidente? – alguém perguntou.

Lincoln, até então muito compenetrado, ajeitou a cartola, que mesmo assim permaneceu torta, e esfregando a barba respondeu:

- “Bem, no meu caso para manter a paz eu tive que ir a Guerra. Não se tratava de lutar contra a dominação e sim de impedir uma divisão. Também tive que trapacear para aprovar a 13ª Emenda, coisa que nosso Gandhi, claro que não concordaria, mas, às vezes é assim mesmo, temos que ter força para manter a paz”.

Ao ouvir essas palavras, um homem negro, o mais jovem do grupo, se aproximou e com um sorriso franco no rosto, Martim Luther King pôs um braço sobre os ombros de Lincoln, que acabara de silenciar, e complementou:

- “Verdade meu Presidente, às vezes é preciso pressionar, como fizemos com mais de 300 mil participantes na Marcha Sobre Washington, mas também concordo com nosso Mahatma quando afirma que a paz, a não-agressão também possui seus resultados inquestionáveis. Enfim, pela paz e pela liberdade temos todos nossas razões e nossos sonhos. Eu pelo menos tenho um sonho”. E todos riram gostosamente com a sacada do Pastor King.

Inclusive aqueles dois que não param de tagarelar, apontou o Gandhi negro.

Quem são perguntou alguém.

- Ithzak Rabin e Yasser Arafat.

- “Claro disse Lincoln, eles representavam dois povos que se odeiam visceralmente e estavam praticamente selando a paz quando foram assassinados. Talvez por isso não parem de falar ao infinito, sobre a violência que poderia ser evitada e como seria possível construir um Oriente Médio pacífico.”

Mais barulhento ainda é aquele grupo comenta um anjinho gorducho que estava calado... estão no fundo do vagão como se fossem clandestinos fazendo uma espécie de reunião.

- “E é uma Reunião disse Chico Mendes... são meus compatriotas do PCB – Partido Comunista Brasileiro... gente que sempre foi contra a luta armada e defendeu a luta política pacífica contra a Ditadura Militar brasileira, mas que foi impiedosamente perseguida e morta por uma tal de Operação Radar dos órgãos da Repressão.”

Puxa cochichou um anjinho com a asa amassada, todos nesse trem defendiam a paz e por isso foram mortos...

Sim, sussurrou outro anjo, com um colar de hippie, todos foram assassinados, todos vítimas da violência que combatiam.

É mesmo disse o asinha amassada. O mundo teima em matar os que defendem a paz. Eliminam a tiros e de todas as formas os pacíficos enquanto tornam heróis os agentes da guerra e da violência.

- "Sim, retornou o do colar de hippie, isso faz parte da estúpida história humana e de sua ânsia de exploração da própria espécie. Os que morrem dessa forma absurda acabam vindo pra cá, para esse trem da paz entre as estrelas para que continuem brilhando pois a mensagem da paz jamais acaba, ela apenas se transforma... A vitória da violência é apenas aparente, pois mesmo matando os homens jamais se matará a idéia e outros homens empunharam a bandeira... Mas o que é que você olha tanto criatura?"

Bem, fala o gorduchinho, sem virar o rosto, é que estou tentando lembrar de onde conheço o maquinista, aquele moço cabeludo e de barbas com aquelas enormes feridas nas mãos.

Passageiros Ilustres:

- Mohandas Karamchand Gandhi: Morto a tiros em 30 de janeiro de 1948 por um hindu radical. Gandhi fez uma revolução sem violência e libertou seu país, a Índia.

- Abraham Lincoln: Morto com um tiro na cabeça por um ator e espião confederado em 14 de abril de 1865. Presidente que estancou a violência da escravidão nos EUA.

- Martim Luther King: Morto a tiros em 04 de abril de 1968 quando se encontrava na sacada de seu quarto de hotel por um racista fanático, em Memphis. Na luta pelo fim da segregação racial em seu país, King superou os líderes que defendiam o uso da violência.

- Itzak Rabin: herói de guerra e premiê israelense assassinado por um radical de direita contrário à paz com os palestinos, no dia 4 de novembro de 1995, minutos antes participara de um comício pela paz na Praça dos Reis, em Israel.

- Yasser Arafat: Líder maior do povo palestino, junto com Rabin ganhou o prêmio Nobel da Paz de 1994. Morto em 11 de Novembro de 2004, sabe-se hoje, em decorrência de anos de contínuo envenenamento realizado pelos serviços secretos israelenses.

- Francisco Alves Mendes Filho (Chico Mendes): ativista que lutava pela preservação da floresta Amazônica e pela manutenção da paz entre seringueiros e grileiros no Acre, morto em 22 de dezembro de 1988, com tiros de escopeta no peito na porta dos fundos de sua casa.

Prof. Péricles

Um comentário:

Anônimo disse...

Assim não vale Péricles.....Me fizestes chorar, pela perda destes pacifistas. Teu blog esta cada dia melhor!
Abração!