quarta-feira, 25 de setembro de 2013

CRONOLOGIA DE UM ABSURDO


A forma obstinado com que a Aristocracia rural brasileira lutou para manter a escravidão é algo para impressionar qualquer um mais desavisado.

A pressão sobre o governo do Imperador D. Pedro II foi tão forte que este, encurralado, enfrentou até a Inglaterra, grande potência de sua época.

De um jeito ou de outro a força da aristocracia se fez valer, de tal forma, que o Império brasileiro acabou criando leis que vão das que foram feitas para não serem cumpridas até as que provocaram grandes risadas pelo absurdo que representavam.

Vejam como foi a Cronologia de um absurdo:

- 1826: para reconhecer a independência do Brasil, a Inglaterra exige, entre outras coisas, que o Brasil acabe com o tráfico de escravos num prazo máximo de cinco anos. Precisando do reconhecimento inglês, D.Pedro I se compromete atender a exigência.

- 1831: Lei brasileira realmente proíbe o tráfico de escravos, entretanto, é feita com tantos mirabolismos que, na prática, dispensa ser atendida. É a famosa “Lei para inglês ver” que iria entrar para nosso anedotário.

- 1843: Cansada de ser embromada a Inglaterra parte para a retaliação. Todos os produtos brasileiros vendidos na Inglaterra são sobretaxados. A intenção dos ingleses é clara. Para não ter prejuízos financeiros o Brasil deve fazer valer a Lei e acabar com o tráfico de escravos.

- 1844: surpreendentemente o Brasil parte para o confronto. Através da aprovação da Tarifa Alves Branco. Os produtos ingleses vendidos no Brasil perdem as vantagens que possuíam desde os Tratados de Stragford, em 1810.

- 1845: Indignados os ingleses promulgam o bill Aberdeen. Essa estranha Lei se auto permitia atacar qualquer embarcação que transportasse escravos, apreender e liberar a “carga” e levar a tripulação para a Inglaterra sendo submetida a julgamento pelas Leis inglesas. Detalhe importante: a Lei delimita a ação ao hemisfério sul para evitar qualquer conflito com outro país escravagista, os Estados Unidos, do hemisfério norte.

- 1850: fragilizados por inúmeros incidentes e temendo algo que o levasse a uma situação humilhante, o governo brasileiro edita a Lei Eusébio de Queirós, que proíbe o tráfico de escravos para o Brasil. Na verdade essa Lei expressa o que a lei anterior já deveria ter acabado.

- 1863/1865: Os Estados Unidos alteram sua Constituição liberal para tornar extinta, em todos os Estados, a escravidão. O Brasil passa a ser a única grande nação escravagista do ocidente.

- 1870: Após o fim da guerra do Paraguai e o retorno do exército fica evidente a postura favorável a abolição adotada pelos comandantes militares. Os militares anunciam que se recusam a fazer o papel de “capitão do mato” (caçadores de escravos). Além disso, funda-se o Partido Republicano unindo as idéias República-abolição.

- 1871: Em 28 de setembro, depois de discussões intermináveis, é assinada a Lei 2040, também conhecida como Lei Visconde do Rio Branco, ou ainda, Lei do Ventre-Livre. Fica determinado que os filhos de escravos sejam considerados livres, mas mantém os pais na condição de escravos. O proprietário dos pais deverá se responsabilizar pela criança e seu sustento até a idade de 7 anos, e a partir disso, não fala mais nada. É mais uma Lei ridícula, um paliativo para manter a escravidão. Muitas pesquisas demonstram que aumenta a mortalidade infantil visto o descaso dos fazendeiros com os recém-nascidos.

- 1880: é criada a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão reunindo pessoas como Joaquim Nabuco e José do Patrocínio. Vários clubes abolicionistas já existiam no país e lutavam como podiam pela abolição. Uma das maneiras evidentes era juntando recursos para comprar cartas de alforria, outras era auxiliando escravos em fuga. Ocorrem sérias desavenças com denúncias de assassinatos de abolicionistas em várias partes do país.

- 1884/1885: O político brasileiro Souza Dantas defende uma Lei que considere livre todos os escravos a partir de 60 anos. Tal proposta causou indignação entre os escravagistas e após acalorados debates é aprovada a Lei Libero-Badaró que torna livre os escravos a partir dos 65 anos e não 60. A Lei dos Sexagenários será chamada nos jornais de a “Lei da Grande Risada”, por motivos óbvios e que dispensam comentários.

Somente, e tão somente em 1888 é assinada a famigerada “Lei Áurea” que aboliu a escravidão, mas que liberou o Estado de qualquer compromisso para os recém libertos. Uma abolição capenga e incompleta.

A questão da escravidão no Brasil mostra claramente a extensão do poder da Aristocracia rural na política brasileira. Demonstra que o Brasil possuía (e ainda possui) uma das elites mais retrógradas e reacionárias do mundo, capaz de lutar de corpo e alma para manter privilégios até mesmo, ultrapassados.

Talvez, assim se entenda porque é tão difícil discutir, de forma técnica e racional, reforma agrária em nosso país.

Prof. Péricles










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