sábado, 15 de março de 2014

O PASSEIO DE SÓCRATES


Conta-nos Platão que um dia tornou-se comum ouvir pelas ruas de Atenas que Sócrates era o homem mais inteligente do mundo. Não apenas o mais inteligente de sua pólis, mas de todo o mundo, e isso incluía os sábios do Egito, os mestres da Fenícia e da Núbia.

Seus discípulos, orgulhosos, andavam pelas ruas de Atenas empertigados, e acabaram levando essa opinião pública em comitiva ao grande filósofo.

Sócrates, segundo Platão, ficou muito abalado com aquela notícia, e após alguns minutos de silêncio, saiu sozinho, sem dizer para onde iria.

Voltou somente à noite, reuniu seus discípulos e pondo a destra sobre o ombro de Platão disse “amigos, o povo de Atenas está errado. Completamente errado. Eu, definitivamente, não sou o homem mais inteligente do mundo e peço-vos que não mais repitam essa inverdade”.

Apesar da noticia envaidecedora, Sócrates se negou um título que não poderia ser comprovado, embora, até mesmos seus alunos o aceitassem e repercutissem.

Platão sempre quis saber, e nos diz isso claramente, onde Sócrates foi naquele dia.

Perguntou ao mestre, mas dele nunca obteve uma resposta.

Certamente, mais do que o espaço físico, foi no seu próprio íntimo, na sua alma, as estradas que percorreu.

Na atualidade vivemos um mundo de aparências e de opiniões rápidas. Opiniões fast food.

A egolatria atingiu picos extremos com o desenvolvimeno de comunidades virtuais e a possibilidade de expor o que se pensa, e o que pensamos, geralmente consideramos verdades.

Praticamente com a mesma velocidade da informação temos a formação da opinião, e, geralmente, a aceitação tácita daquilo que lhe infla o ego ou que parece ser coerente com velhos conceitos.

Em cima do “ouvi dizer” se escreve tratados imutáveis sobre quase tudo.

É importante que as pessoas se informem e balizem suas idéias sobre fatos. Mas, para isso é necessário ir além da comodidade de ouvir sempre o mesmo jornal, ou ler sempre o mesmo articulista. É necessário se educar todos os dias.

Nos convencemos muito rápido que já ouvimos tudo e nos enganamos achando que já vimos todos os filmes.

Sempre haverá novos ângulos.

Importa que nossas opiniões não sejam tão inflexíveis e nossas conclusões menos intransigentes.

Menos certezas e mais espaço para a dúvida e o debate.

E se em dado momento nos achamos espertos, como os discípulos do sábio de Atenas, recordemos o passeio que ele deu e que o fez perceber suas limitações.

Devemos fazer o nosso próprio passeio para, provavelmente, descobrir que sempre é tempo para rever velhos dogmas, o quanto estão velhos nossos rótulos e como é manipulada nossa vaidade.

Não somos os mais bem informados e os mais espertos.

Menos, bem menos.

Prof. Péricles

Um comentário:

Anônimo disse...

Professor Péricles ,
Um texto muito adequado para os dias atuais. O egoísmo egolatrico faz a humanidade sofrer por coisas ínfimas. A necessidade de alguns de serem reconhecidos como os mais inteligentes, os mais esportistas, os mais bonitos, entre outras qualidades desejosas de reconhecimento está adoecendo as relações . Como bem pontuastes menos é sem dúvida alguma muito melhor.
Com admiração da sua aluna do Vigor
Daniela (Argentina)