domingo, 19 de novembro de 2017

OBRIGADO A TER VERGONHA NA CARA



Por Cezar Britto

A nova legislação trabalhista brasileira, agora rebatizada de Consolidação das Lesões Trabalhistas, tornou-se uma das mais perversas do mundo, pois está centrada na compreensão de que o trabalho é “mero” custo de produção, uma “coisa” a ser apropriada pelo menor preço.


Ela nada mais é do que a cria nefasta do grupo patrimonialista que manda na política brasileira desde tempos imemoriais. Ou, em termos mais precisos e atuais, a legislação trabalhista é o produto final da “relação amorosa” do Congresso Nacional com o poder econômico financiador da imensa maioria dos parlamentares.


Não é preciso grande esforço reflexivo para se chegar a esta triste e óbvia compreensão, basta que se observe a composição do atual parlamento, como tem votado cada parlamentar e o seu relacionamento íntimo com as propostas impostas pelo governo representante dos patos amarelos, dos ruralistas desbotados e do capital multicolor.


Crueldade, compromisso ou caridade – conforme o credo abraçado – é do Congresso Nacional a competência de cada parlamentar federal fazer nascer um direito para o trabalhador ou determinar a morte de outro considerado mais injusto. É dele a iniciativa ou aprovação final de todo projeto de lei destinado a criar, regulamentar ou disciplinar o direito ao trabalho digno, assumindo a política que André Rebouças definiu como Aviltar e minimizar o salário é reescravizar, ou o conceito de trabalho como honra em que, se ela, no dizer de Gonzaguinha, Se morre, se mata, não dá pra ser feliz.


Foram os parlamentares quem estabeleceram, por exemplo, a permissão de se demitir o trabalhador por justa causa quando comentem crimes, faltam ao trabalho, maculam a imagem da empresa ou desrespeitam o superior hierárquico. Também autorizaram a demissão imotivada, a quitação anual de direitos não pagos, a possibilidade de mulheres grávidas trabalharem em ambientes insalubres, a supressão de direitos fixados em lei, o não pagamento de horas extras trabalhadas, a quebra da isonomia, dentre outras lesões.


Enfim, tem sido o parlamento um dos protagonistas da política de retrocesso de direitos sociais, fazendo certeira, infelizmente, a constatação de José Lins do Rego: “O pior não é morrer de fome num deserto: é não ter o que comer na Terra Prometida”.


O Congresso Nacional apenas “esqueceu” de aplicar estas regras aos próprios parlamentares, praticando o vergonhoso lema do faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. Neste sentido, paradoxalmente, manteve intacto o “contrato de trabalho”, sem afastamento ou demissão por justa causa, do senador que o STF apontou como praticante de falta grave, no mesmo compasso em que se recusou suspender o contrato do dirigente presidencial acusado de chefe de quadrilha e obstrução à Justiça.


Continua-se pagando os vencimentos de parlamentares afastados, além de horas extras, diárias, liberações de emenda milionárias e mimos indenizatórios de esdrúxulas definições. E permanecem sem abrir processo disciplinar contra o “empregado do público” que, sem remorso, se apropria do patrimônio público. Quebram, assim, a regra simples tão bem sintetizada por Salvador Allende: Não basta que todos sejam iguais perante a lei. É preciso que a lei seja igual perante todos.


Talvez seja esta a grande oportunidade para se estabelecer uma nova regra de direito do trabalho ou direito administrativo, condição essencial para a tramitação de qualquer projeto de lei: direito à reciprocidade de tratamento. Destinar ao parlamentar o mesmo tratamento por ele fornecido ao cidadão, aos trabalhadores e aos servidores públicos. Aplicar no parlamento o que Gandhi chamou de o melhor argumento: o exemplo. Ou, na ausência, aprovar a proposta de Capistrano de Abreu para assim inscrever: Constituição Brasileira, artigo único: todo brasileiro fica obrigado a ter vergonha na cara.



sábado, 18 de novembro de 2017

O CINISMO DA GLOBO


Por Kiko Nogueira



O empresário Alejandro Burzaco, um dos delatores do caso Fifa, acusou a Globo de ter pago propina por direitos de transmissão de competições ligadas à Conmebol, como Copa América, Libertadores e Sul-Americana.



Burzaco, que se entregou em 2015, disse que, por meio de sua empresa de marketing esportivo, subornava autoridades.



Segundo ele, Marcelo Campos Pinto, então diretor da área esportiva da Globo, se reuniu em 2012 num restaurante de Buenos Aires chamado Tomo Uno com Julio Grondona, presidente da AFA, José Maria Marin e Marco Polo Del Nero. No encontro, falaram de pagar 600 mil reais aos dois últimos.



Campos Pinto foi afastado da Globo três anos depois. Estava na casa desde 1994. Dava expediente na CBF e conduzia pessoalmente os contratos de mídia com as equipes nacionais.



Em 2011, com a implosão do Clube dos 13, conseguiu manter o futebol na Globo. A TV passou a ser a principal fonte de receita dos times.



No ano passado, segundo estudo do Itaú BBA, Globo e seus canais pagos injetaram R$ 1,210 bilhão nos 23 maiores deles, que arrecadaram R$ 3,113 bilhões no total.



A demissão foi em consequência do caso Fifa, que já despontava no horizonte. Em nota divulgada na terça, no entanto, a Globo garante que “se surpreende com o relato envolvendo o ex-diretor Marcelo Campos Pinto”.



“A ser verdadeira a situação descrita, o Grupo Globo deseja esclarecer que Marcelo Campos Pinto, em apuração interna, assegurou que jamais negociou ou pagou propinas a quaisquer pessoas”.



Ah, tá! Resolvida a questão.



O cinismo do comunicado é digno do grupo. A relação promíscua de Campos Pinto com os ladrões era absolutamente desavergonhada e conhecida. Quando tornou-se insustentável - graças à Justiça americana -, ele dançou.



Em 2015, Campos Pinto fez um discurso na festa de encerramento do campeonato paulista.



É uma elegia à picaretagem, sem qualquer meio tom, orgulhosa. Foi proferido no início de maio, alguns dias antes de Marin ser preso na Suíça a mando do FBI.



No palco, foi introduzido por Tiago Leifert. Reinaldo Carneiro Bastos, sucessor de Marco Polo Del Nero como presidente da FPF, mereceu lágrimas e voz embargada.



A Justiça americana investiga 24 anos de roubalheira. A Copa do Mundo é transmitida pela TV Globo desde 1970.



domingo, 12 de novembro de 2017

O CORNO DA RUA



Por Mario Santayana​


Se, como dizia Von Klausewitz, a guerra é a continuação da política por outros meios, a missão do jornalismo deveria ser a de escrever a história enquanto ocorre e acontece. Isso se a mídia não estivesse, na maioria das vezes, a serviço de seus próprios interesses e de projetos de poder mendazes, hipócritas e manipuladores.

Só os ingênuos acreditam em imprensa isenta em uma sociedade capitalista – na qual ela defende o interesse de seus donos e anunciantes. E mais ainda em um país como o Brasil, em que praticamente inexistem meios de comunicação públicos, tampouco democráticos e de qualidade, como em outros lugares do mundo.

A “história oficial” que tenta contar a mídia brasileira hoje é a de que vivemos em um país subitamente assaltado, nos últimos 15 anos, por “quadrilhas” e governos populistas e incompetentes. E que tenta, por meio de uma justiça corajosa e impoluta, livrar-se desse flagelo “limpando” a ferro e fogo a nação. Enquanto isso, um governo, coitado, que não é perfeito, alçado ao poder pelas “circunstâncias”, tenta modernizar o Brasil com reformas inadiáveis para tirá-lo de uma terrível bancarrota em que o governo anterior o enfiou.

Mas a história real que ficará registrada nos livros do futuro falará de um Brasil que, no início do Século 21, chegou a sair da 14ª economia do mundo para sexta nos últimos 15 anos – e que ainda ocupa nono lugar entre as nações mais importantes do mundo. De uma nação que mais que triplicou seu PIB nesse período – sem aumentar a sua dívida pública, seus débitos com principais credores internacionais e quadruplicou sua renda per capita, além de economizar mais de US$ 340 bilhões em reservas internacionais.

Um país que cortou o número de pobres pela metade, quadruplicou o número de escolas técnicas federais, construiu quase 2 milhões de casas populares, com qualidade suficiente para atrair até mesmo o interesse de altos funcionários do Estado, como procuradores da República. Um país que tinha voltado a construir refinarias, navios, grandes usinas hidrelétricas, gigantescas plataformas de petróleo e descoberto, com tecnologia própria, abaixo do fundo do mar, a maior província petrolífera do mundo nos últimos 50 anos.

Que expandiu o crédito e o consumo, duplicou sua safra agrícola, projetou-se internacionalmente e forjou uma aliança geopolítica com potências espaciais e atômicas, como Índia, China e Rússia, montando um banco com a missão de transformar-se no embrião de uma alternativa ao sistema financeiro internacional.

Que estava construindo submersíveis – entre eles, o seu primeiro submarino nuclear – tanques, navios de patrulha, cargueiros aéreos, caças-bombardeiros, radares, novos mísseis ar-ar, sistemas de mísseis de saturação, uma nova família de rifles de assalto, para suas forças armadas, por meio de forte apoio governamental a grandes empresas de engenharia de capital majoritariamente nacional, integrando esses esforços com outros países, também do próprio continente, para fortalecer a defesa e a soberania regional contra eventuais agressões externas.

Um Brasil que, por estar fazendo isso, sofreu, nos últimos quatro anos, um ataque coordenado, ideológico e canalha, de inimigos internos e externos. Primeiro, com a revelação do escândalo de espionagem do país, do governo e de empresas, que seriam “coincidentemente” acusados de corrupção por parte de governos estrangeiros.

Depois, por meio de um golpe iniciado com manifestações financiadas de fora do país, desde a época da Copa do Mundo, e de uma ampla campanha de sabotagem midiática e de operações de contrainformação permanentes, com o deslocamento para cá de embaixadores que estavam presentes quando do desfecho de golpes semelhantes e recentes em outros países sul-americanos, como o Paraguai, por exemplo.

Um golpe que, iniciado no ano de 2013, foi finalmente desfechado em 2016 para gáudio do que existe de pior na política brasileira e de nossos concorrentes internacionais. Concorrentes que, como vimos, pretendiam não apenas parar o Brasil no caminho que estava seguindo, de seu fortalecimento econômico, social e geopolítico, mas destruir a economia brasileira, para se apossar, por meio de uma segunda onda de destruição e de desnacionalização de nossas empresas, de nosso mercado interno e de nossos mais importantes ativos públicos e privados a preço de banana, colocando no poder “governos” de ocasião, entreguistas e dóceis às suas determinações e desejos.

Para fazer isso, os inimigos do Brasil agiram e continuam agindo na frente política e na econômica, sustentados por paradigmas tão falsos quanto mendazes. O principal deles, é o que reza que a corrupção é o maior problema brasileiro, e que trata-se, ela, de um fenômeno recente em nossa história, ou que alcançou supostamente “gigantescas” proporções a partir de chegada do Partido dos Trabalhadores ao poder em janeiro de 2003.

Na economia, por outro lado, era e é preciso vender o peixe de que o país está quebrado, quando no grupo das 10 principais economias do mundo, pelo menos seis países – EUA, Japão, Reino Unido, França, Itália, Canadá – têm uma dívida pública maior que a nossa.

Precisam justificar um teto para os gastos do governo para os próximos 20 anos, dizendo que o Estado é superdimensionado e perdulário, quando os EUA, por exemplo, apenas na área de defesa, tem mais funcionários públicos do que o Brasil; quando eles se endividaram para se desenvolver e continuarão a se endividar – e a se armar – livremente, no futuro; enquanto nós estaremos sendo governados por imbecis ou espertalhões a serviço de terceiros, vide os mais de R$ 200 milhões recebidos pelo ministro da Fazenda no exterior nos últimos três anos – como se fôssemos uma mercearia, preocupados não com geopolítica, mas apenas, supostamente, com receitas e despesas, sendo condenados a subir no ringue da disputa em um mundo cada vez mais complexo e competitivo com um olho vendado e um braço e uma perna amarrados nas costas, com nações sem limite real de endividamento, que privilegiam a sua própria estratégia nacional no lugar dessa estúpida modalidade de austericídio.

Finalmente, precisam dizer que diante da supostamente calamitosa situação que o país vive, não há outra saída a não ser privatizar tudo – quando não entregar de mãos beijadas até mesmo a empresas estatais estrangeiras – nossas próprias estatais e seus ativos, na bacia das almas e a toque de caixa, porque elas trabalham mal, dão prejuízo; e servem como cabides de emprego – como se empresas privadas não fossem useiras e vezeiras em tráfico de influência e o genro do rei da Espanha, por exemplo – um ex-jogador de handebol – não tivesse ganhado milhares de euros por reunião, em escândalo conhecido, “pendurado” como membro do conselho de empresas “privatizadas” para capitais espanhóis por estas bandas.

Como seria possível para o governo Temer entregar o pré-sal por menos de R$ 20 bilhões, o controle da Eletrobras, a empresa líder de nossos sistema elétrico, por R$ 13 bilhões, e até a Casa da Moeda – país que repassa a terceiros o direito de imprimir o seu dinheiro não merece ser chamado de nação – se ele admitisse que tem, deixados pelo PT – que acusa de ter quebrado o país – mais de um trilhão de reais em caixa, à disposição do Banco Central, além de uma quantia superior ao que está querendo arrecadar com privatizações apenas nos cofres do BNDES?

A doutrina da viralatice, do mais abjeto e abnegado entreguismo, tomou conta das redes sociais e de sujeitos que desgraçadamente – para a nação – nasceram em solo brasileiro, e não tem pejo de pedir na internet ao governo Temer que entregue tudo, nosso petróleo, nossos minerais, nossas terras, nosso mercado, nossas empresas estatais aos gringos.

Já não basta o desprezo pelo PT e o Nordeste, ou – como se viu nas reações à morte da turista espanhola morta por um bloqueio da PM no Rio de Janeiro – a tudo que esteja ligado à periferia das grandes cidades. É preciso bradar, cinicamente, vestido de verde e amarelo, o ódio que ficou por tanto tempo represado, dentro dos pulmões de uma gente tão calhorda quanto desprezível, contra o próprio país e tudo que lembre nacionalismo, brasilidade, soberania, nestes tempos imbecis e vergonhosos que estamos vivendo.

A desculpa é sempre a mesma. As empresas estatais seriam – contradizendo o próprio discurso anticorrupção que está acabando com dezenas de empresas e grupos econômicos privados nacionais – mais “corruptas” e propícias à criação de “cabides de empregos” que as empresas privadas ou privatizadas, embora sujeitos que participaram diretamente da privatização da Telebras tenham pendurado depois durante anos seu paletó na cadeira de presidente de grandes grupos estrangeiros que retalharam entre si o mercado brasileiro de telefonia móvel e até mesmo o genro do Rei da Espanha, especialista em handebol, tenha participado da farra, ganhando milhares de euros para participar de reuniões do Conselho dessa mesma empresa na América Latina.



sábado, 4 de novembro de 2017

A ESPERANÇA QUE MORRE

Por Maria Fernanda Arruda

Diz a voz popular que ‘de médico e louco cada uma tem um pouco’… E não posso deixar de dar minha opinião sobre a patologia que atingiu nosso país. Infelizmente estou tentando achar outros informes para amenizar os sintomas e pensar que pode haver salvação. Mas não consigo ver essa esperança.


Como esperar recuperação de um organismo atingido por falência múltipla de funções? A verminose é uma perigosa moléstia que por sua solércia faz pensar que tem cura fácil, mas não. Age pela via mais subreptícia, que é por meio dos intestinos e sabota organismos aparentemente fortes.


Como se fosse uma teníase que ganha dimensão dentro do campo intestinal e mesmo eliminada aparentemente volta a ressurgir e prejudicar o portador. Não há como ver nosso Brasil brasileiro senão com os efeitos dessa verminose perigosa que se mostra até letal! Em nossa sociedade os vermes estão tão numerosos que nem se podem disfarçar.


Há togados de diversos tamanhos (gordos, muito gordos, cabeludos e velhos), mas todos contribuindo dentro de sua natureza nefasta para deprimir, violentar e fustigar a saúde social. O que não fazem por si, fazem por seus criminosos protegidos, endinheirados como lhes convém, ainda que estupradores e exploradores sociopatas.


Como vermes que são, deram o golpe covarde valendo-se de ter abrigo intestino nas esferas governamentais. Valeram-se covardemente de suas funções para se vender a um país cúpido que nos quer como sempre quis, nos dominar.


Se a esfera judicial está podre e já deveria ser extirpada como um apêndice que de nada serve e ainda contamina com sua corrupção, as outras reservas vitais apresentam iguais sinais da patologia que atinge o todo. As fardas que se mostraram ineptas para ser vistas como defesa ou anticorpos úteis, continuam em sua inércia doentia.


Com essa situação somática, como esperar reação do todo social? Se não há força confiável, como se erguer um braço ou dar um passo? Estamos como confinados em uma UTI como enfermo que não mostra sinais vitais e fica aguardando óbito! Aproveitando-se da já fragilidade do organismo, mais males vem como sangue sugas a ganharem seus dividendos. E vemos empoleirados nos ministérios as figuras mais sórdidas da política de todos os tempos…


A impressão é de que nem um enfermeiro/a se abala em dar um banho que ao menos alivie o odor nauseabundo de tantos vermes. A situação da moléstia -tudo indica – se deu por indução criminosa de arma química ($$$) produzida nos EUA com o exato propósito de minar corpos que não tivessem defesa orgânica.


Viram que era bem esse caso quando experimentaram essa eventual resistência em 1964. Depois disso, com a tranquilidade de quem triunfou em suas experimentações foi fácil, muito fácil, tomar conta do bem desejado. Temos um Brasil já devorado pelos vermes antes de ser sepultado…


Que pena! Que angústia!



Maria Fernanda Arruda é escritora